Memória - #grupodeescritamatinal
Oba! Alcancei o interruptor!”. Tenho a memória viva da sensação que tive quando, nas pontas dos pés, minhas mãos foram capazes de tocar o interruptor sem o auxílio de um adulto. Eu devia ter uns 3 ou 4 anos e, agora que conseguia ligar e desligar a luz, podia acessar qualquer cômodo e circular pela casa à noite. Senti muita satisfação pela minha superação e confiança no meu potencial.
Não sei porque essa cena ficou marcada em mim, mas desconfio que tenha significado um pequeno grande marco de autonomia na minha infância. Tão pequenina, eu olhava pra cima e via uma imensidão do chão ao teto, mas já era capaz de alcançar até o interruptor. Uau!
Hoje, adulta, quando me reconheço concretizando sonhos e me superando, sei que só consigo porque aos poucos alimentei em mim a confiança na minha potência, e tive pessoas que me estimularam e permitiram novos desafios: eu alcancei o interruptor. Subi em árvores. Aprendi a andar de bicicleta sem rodinhas. Mais tarde peguei ônibus sozinha. Falei em público. E quantas coisas mais realizei ainda que desconfiasse que ia além do que eu era capaz.
A conquista da autonomia não é de um dia pro outro, começa desde muito cedo, e gradualmente vamos acreditando – ou não – em nossa capacidade diante de cada pequeno obstáculo que a vida nos apresenta. É uma construção, uma caminhada, um processo, uma busca por ir além dos limites internos. É assumir riscos e encarar ameaças reais ou imaginárias. É ter coragem apesar do frio na barriga. É aceitar que às vezes não damos conta – e tudo bem. Autonomia também é reconhecer nossos limites.
A régua não é igual para todos nós: o que pra um é tranquilo, pra outro pode ser um desafio e tanto. Mas sempre é tempo de exercitar nosso potencial. Não é preciso estabelecer objetivos grandiosos. Podemos começar escolhendo desafios pequeninos que nos colocarão em contato com a potência que existe em nós e, a cada conquista, sentiremos satisfação e sairemos um pouco mais fortalecidos, conscientes e autoconfiantes.
Se sempre há algo novo a ser superado. Qual é o próximo interruptor que pretendo alcançar?
(Ana Flávia)
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O armário de presentes
Na casa verde, de muro pichado dizeres incompreensíveis e símbolos desinteressados, piso vermelho queimado, frio, limpo, morava a menina do armário de presentes. Todo ano quando fazia aniversário ganhava tantos presentes que era impossível brincar com todos ao mesmo tempo. A Mãe da menina do armário de presentes, sabiamente guardava alguns brinquedos que ela havia ganhado em um armário de madeira, bem no alto, impossível da menina alcançar além de estar muito bem trancado. A menina do armário de presentes, curtia cada mês um novo brinquedo, era aniversário todo dia dizia ela, era aniversário todo mês dizia a mãe dela. Era o armário das surpresas boas. Quando menos se esperava descia um novo brinquedo, colorido, divertido, diferente, de presente, todo dia, um presente. Mas uma regra existia para acessar o armário de presentes. Quando um brinquedo novo descia um velho saia. Era presente novo chegando e um antigo de presente a outra criança virando. Era presente novo todo dia, todo mês, pra menina e pra alguém. A menina do armário de presentes cresceu, e hoje guarda no coração a caixa de presentes que ganhou da vida, da amada mãe e das lições que aprendeu. Dando aos outros lindos presentes que ganhou e se nutrindo com outros tantos da vida. Presente de agora, presente de outrora.
Escrito por Gabriela Lyra
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