Cidade Grande - #grupodeescritamatinal

--- Textos produzidos pelas pessoas participantes do Grupo de Escrita Matinal conduzido por Liana Ferraz

--- Inscrições e informações https://www.liv.us/grupo-de-escrita-matinal 

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Selva de Pedra 

Imensidão , poder , conquistas e corre-corre na selva de pedra .
Sem pássaros , sem cor . A vida em preto e branco . Há vida ?
Frieza  e impessoalidade imperam para se construir o império. 
A dor ? Sim , a dor ! Há dor ? Essa se mantém escondida , acanhada , com receio  de se mostrar , por parecer fraquejar . 
Proíbe-se ser fraco , ser gente , ser preto , ser branco , ser …. 
Há luz ? 
Talvez dentro de nós .


(Adriana Siqueira)

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(Nina Giovelli)

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De frente para a ampla sacada do 25º andar do apartamento que tinha alugado para a estadia de mês tinha-se uma vista impressionante da cidade. São Paulo. Uma das maiores megalópoles do mundo. Sentiu-se no interior de um imenso ser vivo. As ruas eram as veias e artérias que faziam a conexão entre partes inicialmente desconexas. Os edifícios eram órgãos ou partes de órgãos com funções mais ou menos complexas... cada um cumprindo uma função e fornecendo nutrientes os para o funcionamento do grande ser... os humanos ali, em sua maioria eram vistos como tão descartáveis que poderiam ser comparados a uma mitocôndria ou um vírus habitando uma célula... Mesmo assim, eles insistiam em permanecer ali, deve ser porque tudo no grande ser parecia estar sempre conectado: cada coisa no seu lugar, cumprindo sua função... De certa forma, tanto quanto um ser vivo, era tão autossustentável e autônomo e, como um ser vivo mantinha relações com seus semelhantes... como os seres humanos, as relações também hierarquizadas, na maior parte das vezes, ocupando uma posição de superioridade... Por não ser um ser vivo no início de sua existência e por contar com toda a complexidade dos mamíferos superiores, o grande ser pode proporcionar tudo do melhor para os humanos que insistem em habitar ali...  Mas como um ser vivo, a megalópole também tinha suas contradições... o acesso a tudo que tem para oferecer exige que seus inquilinos paguem com dinheiro, suor ou sangue tudo que tiraram de lá... ou suporte toda a descarga de seu sistema imunológico, que tenta de toda forma eliminar o que considera elementos não desejados. Mas também é no interior dessa grande cidade que ocorrem muitas das mutações que vão permitir não apenas a evolução do grande ser,  mas todos que tem relação com ela. As ideias mais revolucionárias, para o bem e para o mal, tem sido germinadas em suas intricadas veias... Estar ali é se permitir, ainda que por pouco tempo, sentir a correria do dia a dia, ver as mais modernas exposições, conhecer as ideias que que nascem nas conversas de botequins, sentir o comportamento da próxima geração... e mais uma infinitude de possibilidades impensadas. Um simples olhar na janela... e toda a expectativa de um mês a se iniciar...


Sirlene Arêdes

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Cinzeiro

As ruas angustiadas,
produzidas em série,
multiplicadas.
Sempre cabe mais um
No cinzeiro da cidade

Fumaça, aperto
Mendicância, solidão
Senhora, pode me dar um trocado?
Me dá uma mão?

Almas em liquidação
Tempo é artigo de luxo
Me angustio, sofro e murcho
Caminhando dentre a multidão

Das pessoas que já desistiram dos sonhos e
Dormem pra trabalhar
Acordam pra trabalhar
Existem pra trabalhar
Bebem pra anestesiar

Criolo cantou a real:
"Não existe amor em SP"

(Maria Helena Aguiar)

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Céu estrelado
À noite, a cidade é ameaçadora. Há becos e ruelas por toda parte, e minha miopia piora muito a esse horário. Qualquer um pode sair de trás de uma árvore, de um poste, virar a esquina, aparecer sem aviso. Nada que não possa acontecer à luz do dia, mas no momento em que reticentes lâmpadas espalhadas pelo asfalto passam a cuspir a iluminação, sinto que perdi o controle imaginário de tudo. O rugir dos automóveis e motocicletas torna-se ainda mais alto, e as portas dos estabelecimentos comerciais são fechadas em série, diminuindo os pontos de pouso disponíveis pelo caminho. Há muitos prédios, e sei que estou sendo registrada por alguma câmera imperceptível. Os moradores recém-chegados fecham os portões com pressa, deixando claro que edifícios não abrigam ninguém que não tenha chaves. Ouço uma sinfonia de buzinas acompanhadas pelo som de sirene de ambulância. Os motoristas tentam dar passagem para alguém cuja vida ou morte depende da ausência de engarrafamento. Um breve momento de solidariedade em meio à cidade hostil. Vejo a longa fila de veículos até não se sabe onde, àquele horário o trânsito tende ao infinito. Algumas pessoas passeiam com seus animais, e vou lentamente recuperando a tranquilidade ao ver o ritmo despreocupado de suas patas e os olhares realizados de quem passou o dia dentro de um apartamento e agora anseia por desbravar os mistérios do asfalto. Chego a meu prédio aliviada por estar em território amigo, mesmo que não conheça nenhum de meus vizinhos. Entro em casa e sinto-me acolhida por meu lar inanimado. Os sons da rua ainda são audíveis do andar onde moro. A casa já está cheia de pernilongos, preciso fechar as janelas. Vejo de cima a cena de que participei minutos atrás, e não entendo como pude achá-la ameaçadora. Do ângulo em que agora me encontro, as luzes dos faróis e os apartamentos acesos, ainda desfocados pela ausência de óculos, misturam-se na escuridão e formam um imenso céu estrelado bem ao alcance de meus pés.

(Fernanda França)

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(Cláudia Suzano)

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É engraçado pensar que alguns lugares me causa nostalgia quando passo por eles. Ficaram na memória e se o céu está cinza ou azul, me causam um sentimento… Ou dois…
Caminhando pelas ruas percebo que as  pessoas continuam apressadas e também continuam esbarrando em você… 
São carros e mais carros, alguns nunca mudam… Não dão seta e você precisa adivinhar se consegue ou não atravessar, porque ele não acendeu a luz piscante que precisa… 
Que lojinhas sumiram e que lojinhas surgiram… Mas a lojinha de doces está maior. E me lembro que antes só uma pessoa passava no corredor, e agora alguns doces estão 3 vezes mais caros do que era… E
O golden e seu dono continuam passeando pela a rua a noite no mesmo horário, antes achava fofinho e hoje lembro da Hannah e rio… 
E descobri que as pessoas vão em uma cafeteria e a atendente te avisa que sua bebida com café tem café… OI?!...Café é vida… E o café de lá nem é tão forte assim… 
Tenho lugares preferidos para comer. Mas as vezes quero explorar, quero um lugar novo… E sempre tem algo novo, mas às vezes é um CAOS… Então tem que esperar para explorar… 
O tempo que passei caminhando por algumas das ruas da cidade percebo que acontece o mesmo em TODA a cidade… Descubro algo novo, me irrito, me encanto, me estresso, me divirto… 
A cidade se define no famoso: eu amo ou odeio, é 8 ou 80… 

(Bia Prestes)

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O meu mundo verticalizado:
14 passos entre quarto e cozinha
10 passos entre sala e sacada
7º andar, centro da cidade
Escuto do barulho da descarga, do chuveiro ligado, das pisadas
conheço os barulhos do vizinho, 
só não o conheço

Das janelas
entram cheiros maravilhosos: doces, comida caseira
não identifico o cozinheiro
ouço a cantoria afinada de lindas melodias
quem é o artista?
vejo da minha sacada
as plantas que enfeitam as outras
não vejo os vizinhos, no máximo seus bichos

(Eve Lima)

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Eu, que no meio do campo e mato vivo, gosto de nesse outro campo passear. 

Tantos barulhos, músicas, tantas luzes, tanta gente! Parece que a emoção nunca vai acabar. Buzinas, carros, movimento, concretos que sustentam tantos muros e divisões, tantas pontes e ligações. Adoro esse lugar!

O mundo passa de cinco dimensões! Como pode haver tanta via, avenida, estradas que passam acima de casa, de predio, uma estrada acima da outra, que é acima da outra, parece que vai bicar lá em cima, a vida estelar. Caminhos flutuando em cima de muita gente correndo, pra lá e pra cá, parecem pouco conversar. 

No campo, a gente olha no horizontal! Os movimentos mais devagar.. se leva a noite inteira para o sol nascer e mais 12 horas para,  lá do outro lado poer. A lagoa sempre encosta no céu certa hora no amanhecer, o verde, todo espalhado te faz olhar para todo o lado. 

O olhar na cidade é mais vertical, para cima no nono andar ou para baixo, olhar no celular, muitas vezes também é de lado para saber se pode atravessar. 

A vida na cidade não para, 24 horas aberta, a todos em qualquer lugar. Às compras, jantares, aos teatros, ao cinema, aos estrelatos e até anonimatos!

Que delícia, é tanta coisa pra fazer, não sei nem o que escolher!

Tudo junto e misturado, parecemos até formiguinhas, pequenas, iguais, naquele enorme lugar. 

Mas quando olho exatamente para um andar daquele grande edifício, vejo uma vida singular, perto de outros acho vidas. Lá, cada uma tem o seu lugar. Conversam mais do que um simples olá! Contam-se do dia divertido, cansativo, da escola, da moda, no modo de cada um.

O dia termina! Não, faz uma pausa a noite, para cochilar e quando menos se espera o barulho a lhes levantar. Tudo de novo começa!

Eu saio bem estreita,  mas sem fazer desfeita, pois foi bom aproveitar! É que vou voltar para o interior, pq aqui dentro mesmo que é o meu lugar.

(Vanessa Kelda)

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